ALO ALO REALENGO

Muito se tem falado sobre o Assassino de Realengo. A de maior veemência é o desarmamento, mas também adoção e o bullying. Para mim todas são importantes e todas tem razão. Porém dentro da minha área de atuação, saúde psíquica, acho que o essencial é a doença mental. O Assassino de Realengo não matou porque tinha armas a disposição, nem porque foi adotado e muito menos porque sofreu bullying. Ele matou porque estava sendo conduzido pelo passe livre da psicose. Ao contrário do senso comum que susteta ser a psicose, esquizofrenia ou, numa forma popular, a loucura, um ato de impulsividade e extravasamento súbito, o que se revela a uma observação mais acurada é um complexo processo de estruturação de sistemas delirantes, que, passo a posso, organizam o mundo externo de acordo com o mundo interno. Desfazem os vínculos emocionais e consequentemente os laços sociais produzindo seres capazes de um rigor tal que prescinde de afeto. E sem afeto, as lógicas humanas caem na crueldade e no ódio. Essencialmente ódio a realidade e passo seguinte a tudo que está vivo. Insuportável para o delírio é a demanda emocional que o social convoca. E nisso, há um absoluto rigor no processo delirante. Como se constata na tragédia escrita por Shakespeare, Hamlet, apesar de loucura tem um método. E esse método pouco tem a ver com bullying ou armas clandestina, embora possa ser facilitado por eles. Trata-se de saúde pública, prevenção e educação. E este método é menosprezado pela saúde pública, pelos amigos, pela sociedade em geral. Ninguém quer se meter com a loucura do outro até que ele comece a atirar nos nossos filhos. Se uma pessoa está com emagrecendo ou com dores corporais, qualquer pessoa próxima vai recomendar uma ida ao médico. Se um sujeito apresenta tonturas, ou torce o tornozelo, o amigo leva para o Pronto Socorro. Essa solidariedade a dor física não acontece na dor psíquica. E o que resulta é o mais completo abandono justamente daquele sujeito que está tomado pelo delírios constituindo um mundo a parte. A intolerância presente na psicose se faz presença na vida cotidiana e para que isso não se repita nem se propague faz-se necessário uma atenção maior para a saúde mental.

Comentários

Helena Mello disse…
Não faz muito percebi que sou preconceituosa em relação a este tema. Se alguém que eu conheço toma remédio para o coração, pulmão ou fígado, fico pesarosa por ser alguém com uma doença. Já aquele que precisa de remédio porque sofre de ansiedade ou depressão me provoca um certo medo e uma vontade de manter distância. E eu que me considero uma pessoa esclarecida...
JULIO CONTE disse…
Coisas da mente assustam mais do que do coração.
Nei Duclós disse…
Muito boa tua abordagem, Julio. Chovo no molhado, pois tua especialidade nos esclarece sobre esse assunto. Excelente análise.

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