Uma reflexão sobre a comédia


O que eu quero falar é que fui assistir A Megera Domada. Como tenho recebido muitas críticas de quem não me assiste, resolvi comentar o que eu vejo. E valido o meu comentário, pois entro no teatro pagando ingresso. Por isso me sinto a vontade para falar da peça que colhe as mais benevolentes criticas. Realmente a peça é bem montada, tem ótimos atores, e percebe-se que temos pela frente um trabalho consistente e bem embasado, bem planejado e bem realizado. Trata-se de uma seqüência de produções da dirigidas por Patrícia Fagundes que foi tão bem na montagem anterior de Sonhos de Uma Noite de Verão. Segue a mesma linha da comédia, porém agora, algumas coisas precisam ser pensadas. Por exemplo, quem se diverte com a comédia. Os atores é certo, pois uma boa comédia faz o público rir e rindo ri de si mesmo sem saber que ele é o objeto do riso. E o que pensar quando vemos uma comédia na qual o público não ri? Enquanto pensam numa resposta, eu conto para vocês que os atores da Megera Domada defendem com ardor o espetáculo, e se divertem muito, jogam entre si, e dão a entender que o que estão fazendo é realmente arte. Único senão é que o público fica um pouco de fora desta festa que vale tudo, vale ser alguém com eu ou como você. Os atores celebram a vida como um grito de gol como o jingle da RBS que inclusive é cantado duas vezes no espetáculo. Foi intrigante pensar no que aconteceu na sala de espetáculo. O humor, a graça, o chiste, a piada é um jogo de cumplicidade a três. Tem o narrador que se alia ao espectador para rir de um terceiro. Isso está descrito por Freud, Bergson e por outros. Às vezes, o terceiro elemento, o motivo do chiste pode até ser o narrador ou o espectador, mas isso não invalida o pensamento triangular. O que vale para o sucesso do empreendimento é se crie uma cumplicidade. Isso aconteceu no espetáculo anterior, mas não se realiza agora na Megera. Por quê? Provavelmente o grupo deve estar se fazendo a mesma pergunta, pois a reação do público é bem diversa, apesar da massa de elogios da classe artística feitas a encenação. Vamos combinar o público não é o fiel da balança, mas conta. O que me veio à mente é que a cumplicidade não se realiza, apesar dos esforços de todo o elenco – em especial do Felipe de Paula, soberano em cena – porque essencialmente a postura do espetáculo frente ao espectador é de auto-reverencia. A relação palco/platéia é tão impregnada de um louvor ao “grande teatro”, “a grande verdade”, “a realidade última da cena” que se torna arrogante. Vamos combinar, é impossível achar graça da arrogância. O efeito de arrogância é colocar o outro – o espectador - num lugar desqualificado e assimétrico. Deixa como única opção admirar o espetáculo e confirmar o que a encenação se propõe. Perde-se com isso o espaço de indecidibilidade e de incerteza. A incerteza e indicidilidade é que cria as opções para a imaginação, pois nos coloca frente a um mundo de possibilidade oníricas. Sem isso, somos – como espectadores – obrigados a amar o espetáculo. E como a própria história do bardo nos mostra, amar tem caminhos muito mais complexos do que a obrigatoriedade. Há um temor reverencial na narrativa que impede que o espectador se torne cúmplice da trama. O jogo do jogo é uma grande idéia, mas o tiro pode sair pela culatra, pois deixa de ser jogo para simplesmente afirmar o quanto sou mais criativo do que vocês.

Mas é claro que tudo aqui publicado é só uma opinião, um trabalho de reflexão. Não perderia meu tempo escrevendo e pensando sobre, se não tivesse um respeito e admiração pelo trabalho da Patrícia Fagundes, dos atores e pelo grupo.

Só o faço, porque a questão é importância essencial, pois da relação de cumplicidade amorosa com o público se joga o destino do teatro como um reduto de cúmplice intimidade nestes tempos em que se atiram filhos pelas janelas.

Comentários

Modesto Fortuna disse…
oi,queridão.
maravilha o teu comentário.
concordo. comédia tem que fazer rir. não basta o sorriso quero a risada gostosa. quando eu crescer quero escrever com esta propriedade que tu escreves. um grande abraço do amigo, roberto o.

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