COMÉDIA É UM NEGÓCIO SÉRIO


Humberto Eco em seu romance O Nome da Rosa destaca a importância da comédia e todo o tipo de repressão, censura e degradação que este gênero teve ao longo da história. Essencialmente pelo caráter insubordinado do humor que pode a todo momento desqualificar o poder divino ou o poder dos homens. O livro perdido de Aristóteles, a parte da Poética referente à Comédia, passa de mão em mão gerando curiosidade e morte. É angustiante vê-lo assim tão ao alcance das mãos, imaginar as conseqüência para a cultura ocidental em caso de sua permanência e, logo, sermos testemunhas de um grande incêndio na Biblioteca do Mosteiro na qual o último exemplar, impregnado de veneno que levava a morte quem o folheava, é definitivamente destruído.
Sigmund Freud na virada do século passado criou a psicanálise com uma série de trabalhos. A Interpretação dos Sonhos é a obra fundadora, pois mobiliza um conhecimento milenar sobre um objeto menor que era os sonhos até então e rearranja em torno da idéia do Inconsciente. Mas este trabalho veio acompanhado de dois outros. A Psicopatologia da Vida Cotidiano, onde os lapsos e atos falhos, outros dejetos do conhecimentos humano desvalorizados, ganham dimensão de comunicar essências. E fechando a trilogia, Chiste e Sua Relação Com o Inconsciente sobre o Chiste, o terceiro na seqüência, mas o primeiro no ranking dos rejeitados.
O extenso trabalho de Freud para entender o humor é recompensado para que goste de aprender. O humor, a piada, o chiste, a comédia tem nuances das mais diversas e sutis. Freud estuda os estudiosos, e como de costume, arisca ter seus próprios pensamentos, assim ele encontra as invariantes que produzem o humor. Classifica os vários tipos de chistes e chega a uma conclusão que o produz humor não é só um nonsense, o desconcerto e o esclarecimento, o ritmo, o caráter tendencioso do chiste, nem no conluio entre dois para gozar do terceiro, nem mesmo no jogo em si. Também não é sobre o preconceito que chiste se realiza, mas sim, a relação se superioridade que o riso produz. A risada é uma forma de estabelecer superioridade quando se está em desvantagem. Uma reparação do narcisismo. Achamos-nos melhor quando rimos, pois os outros é que tropeçam, outros é que são enganados, outros é que se equivocam. A tirada espirituosa nega as injustiças. Só o Bobo Da Corte pode dizer a verdade para o Rei sem perder a cabeça. A lógica fugaz do riso produz reversões de perspectivas e se inverte quando percebemos que estamos rindo de nós mesmo. Jogos sutis de ida e volta. Humor transitivo e intransitivo. Millôr Fernandes escreveu que o homem é o único animal que ri, e que rindo mostra o animal que é. Cada tirada chistosa é resultado de um complexo movimento humano que retira material da realidade do consciente para enviá-lo ao mundo inconsciente dos sonhos e que volte de lá com uma visão diversa e divertida da realidade.
Por isso, achei muito salutar a reportagem da capa do segundo de Zero Hora sobre a comédia. Homens de Perto, Se Meu Ponto G Falasse, Cassadísima, Terça Insana, Santad up comedy, Clube da Patifaria com o Tá e Aí? O humor, a comédia o chiste tem um lugar central na alma humana. Por isso, concordo com a frase genial do Renato Mendonça na reportagem. O problema não é desqualificar a comédia, ao estilo do Mosteiro, pelo simples fato de ser uma peça de teatro que tem público. Afinal este é um dos objetivos de uma peça de teatro, mas sim, perguntar por que aquilo que se considera o grande teatro, o verdadeiro teatro, o teatro essencial, não o tem.

Comentários

Rodrigo Monteiro disse…
oi julio

acho qeu só as coisas mal feitas merecem e precisam ser desqualificadas.

adoro o teu blog

bjus
Homens de Perto disse…
Julinho,
Tu sempre preciso e justo.
Abração
Zé Victor

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