UMBIGO DO SER
Às vezes tenho pena de mim. Por que será que as idéias me vêm à mente com horas de atraso? Será uma sina humana que pensamentos incompletos recorram caminhos até encontrarem um meio de expressão. A inspiração levou Freud a formular que sonho é a realização de um desejo e desejo se articula com a falta. E o ser humano é por isso incompleto em busca de apaziguamento. Ou será e prematuridade, a carência do inato, que obriga o sujeito a um caminhar sem fim? Em parte penso que alguma coisa foi acionada na minha mente e ficou trabalhando em segundo plano, enquanto eu lia, almoçava, caminhava, atendia, e de repente, emergiu uma afirmação, como uma resposta, ou como pergunta, um tanto fora do contexto do cotidiano em que originalmente deveria ser feita. Estou falando isso porque são quinze horas, o debate com Lehmann e os diretores foi ontem e minha mente continua inquieta. Sigo no debate. Começo a falar com o Professor Lehmann, e conto uma experiência que fiz. Poderia ser a Quinta Proposta (veja postagens anteriores), mas não, me imagino descrevendo ao teórico alemão minha peça Essa Noite Se Improvisa na qual convido o público para improvisar. Monto um espetáculo a cada noite, uma mini peça, formada de mini cenas dramáticas. Disponho de um grupo de facilitadores, figurino, trilhas tudo a disposição e armo pequenos jogos com a platéia. Primeiro o lúdico, alegria e celebração, dança coletiva. Jogos. Depois usando a respiração dos jogadores proponho encontros emocionais. E a partir destes, cenas se armam. Eu dirijo a cena que se criam ao sabor da hora. Penso em contar mais detalhes. Mas deixo assim. Pergunto se seria pós-dramático. Ao contrário de vários diretores (todos respeitáveis) que se disseram fazer teatro pós-dramático, não posso fazer o mesmo. Faço o teatro que é possível que a pessoa que eu sou faça. Pensei em perguntar se algum dos diretores e realizadores que compunham a mesa assistiu à peça feita com o público, afinal, todos trabalham com pesquisa. Penso que pesquisa em teatro deve ser algo além do próprio umbigo. Mas, nem no imaginário, falo isso pois seria demais grosseiro. Sei que não assistiram. Como o velho Freud afirmava um sonho nunca seria totalmente interpretado, pois ele se dirige para um lugar desconhecido, nomeado como “umbigo dos sonhos”. Como me dei conta que o teatro que faço é o teatro possível para o artista que sou, chego à conclusão que toda pesquisa deva levar a este ponto, ao umbigo do sonho, umbigo do ser, no limiar de si mesmo. E que cada um precise apenas de si mesmo para se justificar, pois estamos falando de arte. Subitamente me acalmo, e fico feliz de não ter cobrado a presença dos colegas.
Comentários
e tinha hoje uma pergunta para fazer, mas preferi dar o lugar para a Nólibus já que só tinha mais espaço para uma...
Seria sobre marcas do pós-dramático em stand up comedy. te procurei lá, mas não te encontrei no final...
=D
Para além de qualquer funcionalidade, acabo achando que reterritorializar a arte como espaço desse desejo em expansão que não tem função e está para além de qualquer normatização, pode gerar saúde, ampliar a experiência não só da arte, mas do humano.
Abraço
JdR
www.joaodericardo.blogspot.com