O SONHO DE BION ADAPTADO PARA A PEÇA
Abaixo um texto de Wilfred Bion, devida-indevidamente adulterado para fins de compreensão da peça Beckett-Bion: Gêmeo Imaginário que entra em cartaz dia 9 de novembro no Teatro de Arena. A maior parte do texto corresponde ao que Bion escreveu no primeiro volume da Memória do Futuro, no livro chamado O Sonho. Que era dele e agora é nosso.
Julio Conte
Reivindico
que isto é um relato fictício de psicanálise, nem Bion, nem Beckett viveram
isso dessa forma. Foi um sonho artificialmente construído.
Pretende-se
que essa hipótese seja levada a sério e seja aplicada com toda a seriedade, na
prática da psicanálise, do teatro e da arte de viver em geral, mas só por
aqueles que desejam confrontar-se com aquilo que acreditam serem os
"fatos" de modo tão próximo ao númeno
quanto o animal humano possa chegar.
Sustento,
ao lado de Kant, que a coisa-em-si é incognoscível. Didi e Gogo são mais
"reais", nas formulações verbais de Beckett, do que incontáveis
milhões de pessoas.
Até
mesmo em casamentos somos obrigados a acreditar, já que sua existência é
certificada e garantida por uma certidão oficial escrita e registrada no
cartório da nossa civilização!
Muitas
pessoas que tive contato são de tal modo sem vida que, em silêncio, suspeito
não acreditar na evidência de meus sentidos.
Num
extremo do espectro, a evidência "científica" pode me convencer de
que essas pessoas existem; no outro extremo, existem personagens de ficção, das
quais com certeza poderia ser dito que não existem. É um paradoxo.
Existem
“homens espertos” que confrontados com uma obra de arte, podem ver que ela é
genuína e que vale muito dinheiro, mas não percebem aquilo que o artista
revelou.
Um
especialista pode ver vértice – que é uma descrição de Freud ou de Melanie
Klein, mas permanecer cego para a coisa descrita.
Freud
disse que as crianças eram sexuais; isso foi negado ou re-enterrado. Tal
destino poderia ter ocorrido à psicanálise inteira, se não tivesse havido
alguém, como Horácio dizia de Homero, para conferir-lhe imortalidade.
Se a
intuição psicanalítica não provê uma reserva para seus pensamentos selvagens,
onde se vai achar um zoológico para preservar as espécies?
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