ENQUANTO AGONIZO - parte dois


Mais uma amostra dos textos da peça "ENQUANTO AGONIZO"




ALENCAR
Estou no quarto do meu pai. Ele está morto. Não sei como cheguei aqui. Acho que foi meu
irmão que me carregou pela mão. Não, foi a minha irmã. Ou talvez minha mãe. Só sei que
estou no quarto do meu pai agora. O cheiro ainda é de morte. A morte tem um cheiro ácido.
Talvez seja a carne que perde a alma, o corpo que pesa sem vitalidade. Eu não choro e eu
não sei por que eu não choro. Não sei nem como cheguei aqui. Alguém me carregou. Uma
pessoa ou um sonho. Um pesadelo. Todos choram. Eu não. Olhando bem, não tem ninguém
chorando. Não estou aqui. Estou aqui e não estou aqui. Estranho não ser eu mesmo! Não estar
aqui onde estou! O cheiro ainda é do meu pai – de morte. O corpo dele sobre os lençóis pesa.
Engraçado como mesmo depois da morte o corpo marca os lençóis! Como se ainda existisse.
Como se tivesse algo ali. O quarto do meu pai morto. Não sinto nada. Queria sentir meu
coração bater mais forte, mas meu corpo está tão morto quanto.

Dias 12, 13, 14 dezembro
Sala Carlos Carvalho da Casa de Cultura Mario Quintana
21 horas

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