PARTIDA DA INDIA
Anaia olha para mim. Cada ruga,
isso só vou descobrir no futuro, lembra uma circunvolução do cérebro. Ela tem
mais de 300 anos e não vai morrer nunca. Eu tenho oito e vou fazer uma viagem
para outro mundo. Londres. Tigres passeiam em torno ao nosso acampamento e eu
sonho com mamãe, me enrosco em seu calor e sua pele sedosa é um doce véu sobre
meu corpo.
Pela janela a Índia. Gente
bondosa caminhando com pés desnudos. Incenso e uma música no ar. Cores em cima
do marrom.
Pela janela a paisagem veloz, a
montanha que se move, rápida, o céu que
escurece num átimo e a chuva que logo vem, a noite que se instala e o dia que
volta. Tudo sob um ritmo binário do progresso.
Pela janela, crianças brincando
no pátio da escola. Minha mãe se vira e parte, entre num carro conversível e
abana para mim. Lágrimas nos olhos, ela nunca olhou para trás. Entrou no carro
e só a verei novamente aos 18 anos.
A primeira janela é a Índia,
Mutra dos meus sonhos.
A Segunda, a cidade elétrica., a
eletricidade, o trem que me levou da Índia para a Inglaterra.
A terceira é a Escola na
Inglaterra. Escrevi no
caderno: Newberry House, Hadam Road, Bishops Stortford, Hertfordshire, England.
Um menino, colega de quarto, leu por cima do meu ombro. Deu uma risada
marota e disse:
-
Você esqueceu de colocar mundo.
Eu coloquei também. Depois
assinei. Por aquele momento, mesmo que eu não soubesse, meu nome era, por um
instante, Wilfred Ruprecht Bion.
Outras janelas se abrirão.
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